Interdição da Pessoa com Deficiência Intelectual – Tutela e Curatela

Autora: Maria Aparecida Gugel

 Dúvidas mais freqüentes de pais de pessoas com deficiência intelectual da APAE-DF

 Tutela

  • O que é tutela?

É um encargo atribuído pelo Juiz a uma pessoa que seja capaz de proteger, zelar, guardar, orientar, responsabilizar-se e administrar os bens de uma criança ou de um adolescente menor de 18 anos, cujos pais são falecidos, ou estejam ausentes, ou tenham sido destituídos do poder familiar.

Poder familiar é o conjunto de direitos e obrigações que os pais têm perante os filhos (zelar pelo seu bem estar e por sua educação, alimentar, vestir). Perde-se o poder familiar em função de maus tratos, negligência ou falta de condições para prover o sustento dos filhos.

  • Quem pode ser tutelado?

A criança e o adolescente, menor de 18 anos, e não tiver pais (falecido ou ausente), ou quando seus pais tiverem destituídos do poder familiar pelo juiz e, ainda, quando não for casado, alistado no exército ou emancipado.

  • Quem pode requerer a tutela?

Os avós, os irmãos, os tios, ou qualquer outra pessoa que conheça a criança ou adolescente, observada esta ordem e sempre levando em conta o interesse da criança ou do adolescente.

  • Quem pode ser tutor?

O pai e/ou a mãe. Na falta dos pais (se falecidos, ausentes ou destituídos do poder familiar) o tutor é designado pelo Juiz e pode ser qualquer parente ou pessoa próxima, desde que seja idônea, pois irá assumir o compromisso legal de zelar pelos direitos e garantias do menor tutelado, promovendo-lhe a educação, saúde, moradia, lazer, convívio familiar, etc.

  • O que se espera do tutor?

O tutor é o representante legal da criança ou adolescente tutelado. Espera-se que administre o patrimônio (pensão, aluguéis, contratos) do tutelado, suas despesas e dívidas e o represente nos atos da vida civil, tais como a matricular na escola ou cursos, autorizar viagens, autorizar internamentos hospitalares e cirurgias. É responsável pela saúde, educação, lazer e pelo bom desenvolvimento das funções emocionais e afetivas do tutelado. Antes de assumir a tutela, o tutor deve comprovar que também possui renda ou bens compatíveis com o patrimônio que irá administrar pelo tutelado (o que é feito pelo procedimento de especialização da hipoteca legal).

Curatela

  • O que é curatela?

É o encargo atribuído pelo Juiz a uma pessoa que seja capaz de proteger, zelar, guardar, orientar, responsabilizar-se e administrar os bens de uma pessoa declarada judicialmente incapaz. A incapacidade está atrelada à má formação congênita, transtornos mentais, dependência química ou doenças neurológicas.

A incapacidade da pessoa é de reger os atos da vida civil, ou seja, de compreender as conseqüências de suas ações e decisões em relação à assinatura de contratos, vender e comprar, movimentar conta bancária, entre outros.

  • Quem pode ser curatelado?

Pessoa maior de 18 anos de idade que devido a alguma enfermidade, doença mental ou dependência química seja impedida de temporária ou permanentemente de reger e discernir os atos da vida civil.

As pessoas com deficiência que não puderem exprimir sua vontade e as pessoas com deficiência mental (ou intelectual).

Os ébrios e os pródigos (pessoas esbanjadoras ou compulsivas que colocam em risco seus bens e/ou patrimônio, bem como a sobrevivência de seus dependentes e da família). O nascituro (feto) e o recém-nascido, cujo pai tenha falecido antes de seu nascimento, e a mãe não tiver condições de exercer o poder familiar.

A pessoa doente ou o deficiente físico, que se julgar incapaz de administrar seus bens ou não puder exprimir sua vontade.

  • Quando deve ser requerida a Curatela?

Quando a pessoa não puder manifestar sua vontade ou gerenciar a sua própria vida de forma independente.

  • Quem pode requerer a curatela?

O pai, a mãe, o tutor, o cônjuge, o parente próximo, o Ministério Público, ou ainda qualquer pessoa interessada, pois a medida tem por objetivo proteger o interesse da pessoa com deficiência.

  • Quem pode ser o curador?

O cônjuge ou companheiro do interditado. São curadores legítimos o pai ou a mãe. Na falta destes o parente mais próximo, ou qualquer outra pessoa nomeada que se responsabiliza perante o Juiz pela pessoa do interditado. Os pais podem indicar em testamento o curador de sua preferência.

  • O que se espera do curador?

Representar o interditado, zelar pela garantia de seus direitos fundamentais, administrar seus bens, pensão ou aposentadoria (caso possua). Proteger e velar pelo bem-estar físico, psíquico, social e emocional do interditado.

  • O que é prestação de contas na tutela e na curatela?

É um relatório apresentado na forma contábil e encaminhado periodicamente (anual, semestral, trimestral) ao juiz pelo advogado ou defensor público que representa o tutor e o tutelado ou curador e o curatelado, contendo a descrição dos ganhos financeiros e despesas administradas pelo tutor em favor do tutelado.

A prestação de contas é obrigatória quando houver a substituição do tutor ou quando o tutelado completar a maioridade civil, ocasião em que a tutela será extinta.

  • O que acontece se o tutor e/ou o curador falecerem?

O fato deve ser informado imediatamente ao Juiz onde teve curso o processo, solicitando a substituição do falecido por outra pessoa.

A comunicação ao juiz e a substituição são necessárias para dar continuidade a administração dos bens, recebimento de pensão ou rendas. A demora na substituição poderá causar prejuízos materais ao interditado.

  • O tutor e/ou o curador podem ser substituídos?

Sim, podem ser substituídos se não cumprirem com as atribuições legais e judicialmente determinadas.

Deve ser solicitada a substituição em casos de falecimento, doença e acidente que os impossibilitem de exercerem suas funções.

  • Qual é a responsabilidade do tutor e/ou curador quanto aos atos praticados pelo tutelado/curatelado?

Caso o tutelado ou curatelado cometa algum ato que cause dano material a terceira pessoa o tutor ou o curador serão responsabilizados financeiramente pelo prejuízo. Se o tutor ou o curador não tiverem patrimônio algum, poderá ser responsabilizado o patrimônio do tutelado ou curatelado, desde que existente.

O tutor ou curador poderão reaver do tutelado ou curatelado, juridicialmente, o valor pago em indenização para a terceira pessoa.

Se o ato praticado pelo tutelado ou curatelado for uma infração ou um crime, eles próprios responderão perante a Justiça, cabendo ao tutor ou curador providenciar advogado ou defensor público para a defesa.

Interdição

  • O que é interdição?

É um direito da pessoa com deficiência para lhe garantir proteção. É uma medida judicial que declara a falta de capacidade da pessoa para gerir seus negócios e atos decorrentes da vida civil. A interdição pode ser total ou parcial e será nomeado curador para representar a pessoa interditada.

A interdição é um instrumento judicial necessário para se obter a curatela.

  • Como proceder à interdição?

É um processo judicial que se inicia com um pedido dirigido ao Juiz, por meio de petição inicial apresentada por advogado ou defensor público.

O pedido deve ser apresentado no juízo do domicílio da pessoa e conter: a prova da legitimidade do autor da ação e a prova da incapacidade do interditando para exercer os atos da administração de seus bens.

Se o objetivo da ação for para obter a decretação de interdição total, deve ser indicado o artigo 1.767, inciso I do Código Civil.

Se o objetivo da ação for para obter a decretação de interdição parcial, devem ser indicados os incisos III ou IV do artigo 1.767 do Código Civil. A petição inicial deve conter pedido expresso de que a sentença de decretação da interdição mantenha os direitos de trabalhar, votar, ter conta bancária, receber direitos previdenciários.

O juiz determinará a citação do interditando e o ouvirá para se convencer sobre sua capacidade. Após o prazo de cinco dias para impugnar a petição inicial, serão produzidas provas da deficiência e grau de comprometimento por meio de laudo do perito. Poderão ser ouvidas 6 testemunhas. O juiz julgará o pedido e decretará a interdição, nomeando o curador e, ao mesmo tempo determinará os limites da interdição.

A sentença judicial produz efeitos imediatos, devendo ser registrada em cartório de registro de pessoas naturais.

Será expedido mandado, com cópia da sentença, e edital para ciência de terceiros, noticiando a decretação da interdição, dele constando os nomes do interdito e do curador, a causa da interdição e os limites da curatela.

O procedimento judicial está previsto nos artigos 1177 e seguintes do Código de Processo Civil.

  • Quem pode promover à interdição?

Os pais, em conjunto ou não, ou tutores, o cônjuge ou qualquer parente próximo, na falta dos primeiros. O Ministério Público Estadual promoverá a interdição em casos de doença mental grave.

  • Quando promover à interdição?

A partir do momento em que a pessoa completar 18 anos de idade.

  • A interdição pode ser cessada? E quem pode solicitar?

Sim, quando cessar a causa que determinou a interdição. Nesse caso, o juiz para decidir sobre o levantamento da interdição, nomeando um perito para emitir laudo, podendo também ouvir testemunhas.

A própria pessoa interditada poderá solicitar o levantamento da interdição.

  • O que é interdição parcial?

É a interdição proporcional ao desenvolvimento mental do interditando ou ao seu comprometimento intelectual.

Nesse caso, o interditando possui habilidades, aptidões e autonomia para praticar alguns atos da vida civil, sem que seja necessário o curador.

É o perito, via de regra um médico, nomeado pelo Juiz que afere o desenvolvimento do interditando. Daí a necessidade de se requerer ao Juiz que nomeie uma equipe multiprofissional constituída de psicólogo, assistente social, fonoaudiólogo para aferir o interditando com deficiência intelectual.

Em resumo, qual é a diferença entre tutela, curatela e interdição?

A tutela é uma medida de proteção da pessoa menor de 18 anos, órfão de pai e mãe ou quando estes estão destituídos do poder familiar.

A curatela é uma medida de proteção da pessoa maior de 18 anos de idade, que se enquadre nas hipóteses do artigo 1.767 do Código Civil.

A interdição é o processo judicial por meio do qual se requer a curatela do incapaz.

Interdição e Trabalho

  • A pessoa com deficiência intelectual interditada pode trabalhar?

Sim, pois o acesso ao trabalho é um direito garantido a todos pela Constituição da República. A pessoa deverá ter habilidades e qualificação profissional para as funções a serem exercidas.

A pessoa com deficiência intelectual interditada pode assinar e rescindir seu contrato de trabalho, assinar recibos e receber salários?

Se a interdição da pessoa for total, o curador praticará todos os atos decorrentes do contrato de trabalho: assinar e rescindir o contrato de trabalho, assinar recibos de pagamento e verificar o efetivo recebimento do valor do salário.

Se a interdição for parcial, ao curador caberá dar quitação das verbas decorrentes da rescisão do contrato.

Interdição e Conta Corrente em Banco

A pessoa com deficiência intelectual interditada pode ter conta corrente em banco?

Sim, e quem administra a conta bancária é o curador.

 

Interdição e Direito de Votar

  • A pessoa com deficiência intelectual interditada pode votar?

A Constituição da República e o Código Eleitoral não fazem qualquer restrição à pessoa com deficiência intelectual.

A pessoa com deficiência intelectual que esteja interditada parcial ou totalmente pode exercer o direito ao voto, desde que o comprometimento intelectual que possua não a impeça de livre manifestação da vontade.

É aconselhável requerer ao juiz que resguarde o direito de votar.

Benefício da Prestação Continuada – BPC

  • O que é o benefício da prestação continuada – BPC?

É um benefício assistencial – não é pensão previdenciária – devido a toda pessoa com deficiência que comprove não possuir meios de prover a sua própria subsistência ou tê-la provida por sua família.

O valor do benefício pago é de um salário-mínimo mensal.

  • O que a pessoa com deficiência deve fazer para obter o BPC?

Deve dirigir-se a um posto do INSS, preencher o requerimento, comprovar a deficiência e renda mensal familiar inferior a ¼ do salário-mínimo por pessoa.

A pessoa com deficiência precisa estar interditada para receber o BPC?

Não, a interdição não é requisito para a concessão do benefício da prestação continuada.

  • O que fazer se o INSS indeferir o benefício?

Se a avaliação das condições estiver equivocada, a pessoa com deficiência de procurar um advogado e ingressar com ação judicial contra o INSS, no Juizado Especial Federal, visando receber o benefício a que tem direito.

  • A pessoa com deficiência que recebe o BPC pode exercer uma atividade remunerada?

Sim, desde que o valor recebido pela pessoa com deficiência, somado aos demais rendimentos da família, não seja superior a ¼ do salário mínimo por pessoa.

  • E se for com carteira de trabalho assinada, pode continuar a receber o BPC?

Primeiro caso: Não, porque o benefício assistencial não pode ser acumulado com salário decorrente de contrato de trabalho. Daí porque se a pessoa com deficiência assinar um contrato de trabalho, tiver uma atividade empreendedora, autônoma ou em cooperativa será suspenso o BPC.

Se perder o emprego ou qualquer das atividades remuneradas poderá requerer a continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem a necessidade de realizar perícia, dentro do prazo de dois anos.

Se tiver direito ao seguro desemprego, só poderá retornar ao benefício da prestação continuada decorridos os cinco meses da concessão do seguro.

Segundo caso: Sim, se for um jovem aprendiz. A nova lei n° 12.470/2011 permite ao jovem aprendiz acumular o salário do contrato de aprendizagem e do benefício da prestação continuada (salário + BPC) pelo prazo máximo de dois anos.

Poderá também ser aprendiz as pessoas com deficiência acima de 24 anos e não será exigida a comprovação da escolaridade do aprendiz com deficiência intelectual, devendo ser consideradas as suas habilidades e competências relacionadas com a profissionalização.

  • A pessoa com deficiência que mora com outra pessoa que já recebe o BPC pode pedir o mesmo benefício para si própria?

Sim, pois o benefício já recebido pela outra pessoa (pessoa idosa ou outra pessoa com deficiência) não integra o cálculo da renda familiar máxima. Porém, a pessoa com deficiência não poderá acumular o benefício de prestação continuada com outro benefício previdenciário (pensão, aposentadoria).

Aposentadoria e Pensão

  • A pessoa com deficiência intelectual tem direito à aposentadoria?

Sim, desde que tenha completado 35 anos contribuição à Previdência Social, se homem, e 30 anos, se mulher. Deverá ainda ter a idade mínima de 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).

E à pensão dos pais?

Sim, com a morte dos pais, se a pessoa for menor de 18 anos. Se for maior de 18 anos, a pessoa interditada parcialmente e, cadastrada perante o INSS como dependente dos pais (aconselha-se que se solicite ao juiz para que na sentença que decreta a interdição parcial conste que o interditado tem direitos previdenciários).

  • Quando trabalha com carteira de trabalho assinada, perde o direito a esta pensão?

Não, a pessoa com deficiência intelectual ou com deficiência mental que optar por trabalhar terá a redução de 30% do valor da pensão enquanto perdurar o vínculo de emprego, o trabalho por conta própria, o sistema cooperativado.

  • A pessoa com deficiência intelectual pode receber mais de uma pensão?

Sim, pode receber mais de uma pensão, desde que sejam de níveis distintos da administração pública a exemplo de pensão do Distrito Federal e federal, ou uma pensão municipal e uma federal, etc.

Serviço Militar

  • A pessoa com deficiência está obrigada a prestar o serviço militar?

A pessoa com deficiência está isenta do serviço militar. Porém, deve se apresentar a uma unidade militar das Forças Armadas para ser dispensado.

 

Bibliografia

FAVERO, Eugenia Augusta Gonzaga. Direitos das Pessoas com Deficiência: Garantia de Igualdade na Diversidade – Rio de Janeiro: WVA Ed., 2004.

GUGEL, Maria Aparecida Gugel. Pessoa com Deficiência e o Direito ao Trabalho: Reserva de Cargos em Empresas, Emprego Apoiado. Florianópolis : Editora Obra Jurídica, 2007.

 

* Fonte: http://phylos.net/direito/tutela-curatela/#curatela